
Senso de equilíbrio e o controle primário
Técnica Alexander - Pedro Souza
“Você não pode fazer algo que não sabe se continuar fazendo o que sabe.”
- F.M Alexander
A magnificência do corpo humano vai além de nossa percepção da realidade. Estamos experienciando o mundo por meio desse organismo vivo, e nossa ideia de ser/self apóia-se nas funções do nosso corpo. Não podemos ter uma experiência se não for sentida, ouvida ou vista.
A Técnica Alexander é um método educacional desenvolvido por F.M Alexander (1869-1955). Este método trabalha com o indivíduo em sua unidade psicofísica, nos auxiliando a usar mente/corpo de maneira eficiente. Por trabalhar nas profundezas de nosso eu corporificado, a T.A. nos permite mudar nossos hábitos em sua raiz.
Para mudar um hábito, seja ele mental ou físico, precisamos primeiro estar cientes deles. E uma maneira de estar ciente de nossos padrões é observar como estamos agindo no momento presente.
O método desenvolvido por Alexandre possui três pilares que sustentam o processo da reeducação psicofísica. (1) Quando Observamos a nós mesmos, passamos a compreender os impulsos por trás de nossos hábitos. A observação nos traz a atenção consciente. (2) Uma vez que tomamos conhecimento de um padrão, devemos Inibi-lo. Este processo é um ato contínuo de "não fazer" que ajuda a aumentar a nossa consciência sobre nossos padrões de pensamento e reação. Embora queiramos inibir nossas respostas automáticas, ainda buscamos movimentos. (3) A próxima etapa é decidir quais Direções tomaremos. A direção é o princípio que permite que o novo processo de pensamento se manifeste (movimento).
Esses três pilares são a base de qualquer aula da Técnica Alexander, que nos auxilian em identificar e modificar nossos hábitos. A ideia é liberar a tensão extra mantida por todo o corpo, começando com a relação cabeça-pescoço-coluna e descendo por todo o corpo.
Este trabalho é sobre como otimizar nosso controle sensório-motor por meio do controle primário, a relação da cabeça-pescoço-coluna com todo o corpo em resposta à gravidade e ao movimento. Esses princípios são aplicados na forma de pensamentos; você pensa sobre eles e deixa seu corpo responder.
“Existe no homem, como em todos os outros vertebrados, um controle primário que condiciona o uso adequado do organismo total. Quando a cabeça está em uma certa relação com o tronco, então todo o organismo psicofísico está funcionando com o melhor de sua capacidade natural. ” Aldous Huxley, The Saturday Review of Literature.
O controle primário é o movimento principal durante o equilíbrio, na postura em pé, durante uma caminhada e na posição sentada. Ele é um reflexo mestre na coordenação de todo o organismo psicofísico. (F.M, The Use of The Self, 1932)
Nosso senso de equilíbrio (equilíbriocepção) é responsável pelo equilíbrio e pela orientação espacial, contribuindo para a nossa capacidade de não cair quando estamos de pé ou em movimento. O equilíbrio funciona em conjunto com outros sistemas sensoriais simultaneamente: (1) proprioceptores (consciência corporal da posição e movimento de partes do corpo); (2) sistema visual (visão, e nos ajuda a manter a consciência da posição quando em movimento ou parado); e (3) sistema vestibular (percebe e inicia movimentos para manter o equilíbrio e a orientação). Esses sistemas sensoriais também respondem a nossas demandas emocionais. Vamos dar uma olhada em como esses sistemas funcionam durante o equilíbrio.
Proprioceptores
Sentido de posição
O alinhamento das partes do corpo envolve interações complexas entre ossos, articulações, fáscia, músculos e sistema nervoso. Os proprioceptores são orgãos sensitivos encontrados em ligamentos, musculos e tendões. Eles são responsáveis por enviar ao sistema nervoso central informações sobre pressões, tenssões, e especialmente sobre a posição e o movimento do corpo.
1.Proprioceptores no músculo
Existem receptores (fusos musculares) de estiramento/ alongamento responsáveis por detectar mudanças no comprimento de um músculo. Estes receptores contribuem para o controle motor e informa o sistema nervoso central sobre a posição dos membros. Os fusos musculares têm uma resposta reflexiva ao contrair o tecido para evitar alongamento excessivo e possíveis danos às fibras musculares. Esse reflexo é muito rápido, apenas dos nervos periféricos até a medula espinhal e vice-versa. O objetivo desses receptores é proteger o corpo de lesões causadas por alongamento excessivo e manter o tônus muscular.
Um exemplo simples de como os fusos musculares funcionam é quando você está quase dormindo em um ônibus de viagem, e cada vez que sua cabeça cai para a frente, o reflexo dos músculos posteriores do pescoço se contraem trazendo a cabeça de volta à posição natural. Este reflexo é constante na postura ereta, onde se mantém alternando entre os músculos - pares antagônicos.
2.Proprioceptores no tendão
Conhecidos como órgão tendinoso de Golgi, esses receptores são encontrados dentro dos tendões ligados às fibras musculares extrafusais. O órgão tendinoso de Golgi detecta a tensão no complexo músculo-tendão e funciona como um mecanismo de proteção para garantir que forças anormais não sejam transferidas para os ossos. À medida que a tensão no músculo aumenta, o OTG envia sinais para a medula espinhal que inibe a ativação muscular, criando um reflexo de relaxamento. O OTG nos dá a sensação de peso.
3. Proprioceptores no ligamento
Os estudos sobre os proprioceptores nos ligamentos ainda são discutíveis e controversos. No entanto, estudos sobre a propriocepção nos ligamentos do joelho podem nos dar algumas pistas sobre como esses receptores funcionam. Os receptores articulares funcionam como mecanorreceptores, sensíveis à pressão e distorção. Os mecanorreceptores localizados nos quatro ligamentos principais do joelho trabalham dinamicamente, cada um respondendo a um estímulo diferente; pressão, posição, movimento/velocidade e amplitude. O papel principal dos receptores articulares é proteger a articulação quando a articulação está próxima de sua amplitude maxima de movimento, iniciando os reflexos musculares de proteção.
Por suas respostas reflexivas automáticas ao alongamento muscular, os proprioceptores trabalham juntos e dinamicamente entre músculo-tendão-ligamento, mantendo a estabilidade por todo o corpo. Uma articulação não pode se mover sem um encurtamento muscular, o que afetará o comprimento dos músculos e tendões e de forma antagônica alongando os músculos opostos, resultando no movimento da articulação. Esses órgãos neurossensoriais funcionam regulando a tensão muscular em todo o corpo, nos permitindo ficar sobre duas pernas e nos mover em várias direções.
Sistema vestibular
Quando pensamos em equilíbrio, precisamos considerar o sistema vestibular. Localizado no ouvido interno em um sistema de compartimentos chamado labirinto vestibular, que é contínuo com a cóclea. O sistema vestibular é responsável por fornecer informações ao nosso cérebro sobre a posição da cabeça, movimento e orientação espacial. E também envolve as funções motoras que nos permitem manter o equilíbrio, estabilizar a cabeça e o corpo durante o movimento e manter a postura.
Existe a hipótese de que o Sistema Vestibular desempenhe um papel crucial durante os primeiros estágios de desenvolvimento, tanto nas funções sensório-motoras quanto cognitivas e na construção e percepção do “eu/self”.

O labirinto vestibular incorpora três canais semicirculares localizados em um plano no qual a cabeça pode girar. Cada um dos canais possui um fluido chamado endolinfa, que se move de acordo com a posição da cabeça. O movimento desse fluido influencia os receptores sensoriais localizados dentro do sistema vestibular que liberam neurotransmissores para o cérebro sobre a posição da nossa cabeça, dando-nos orientação espacial e equilíbrio dinâmico e estático.
Sistema Visual
Você sabia que o sistema visual influencia o equilíbrio e a orientação espacial ? Mais da metade do cérebro é envolvida em processos de informação visual, dedicando-se a converter sinais recebidos dos olhos em mensagens neurais que nos fornecem informações sobre luz, cor, formas, movimento e direção.
Essas informações são percebidas pelos fotorreceptores, células fotossensíveis localizadas na retina. Existem dois tipos de fotorreceptores, bastonetes e cones. Os bastonetes são mais sensíveis às mudanças de luz e escuridão, forma e movimento, enquanto os cones são mais sensíveis às cores. Os fotorreceptores são responsáveis por fornecer orientação visual de um objeto para outro e contribuir para a orientação espacial e equilíbrio.
Há também o reflexo dinâmico dos olhos (reflexo vestíbulo-ocular) que garante a estabilidade visual em qualquer circunstância em que movimentos incompatíveis da cabeça e do entorno visual prejudiquem a estabilidade visual. Este reflexo move os olhos na direção oposta quando a posição da cabeça muda (sistema vestibular).
Agora que temos um entendimento básico de como nosso corpo funciona em relação ao equilíbrio e movimento, vamos voltar à Técnica Alexander e seu Controle Primário.
Relação cabeça e pescoço/coluna
Aka Controle Primário
Controle primário é o termo usado por Alexander referente à organização contínua da cabeça-pescoço-tronco em coordenação com o resto do corpo e o movimento. Este termo é sobre a habilidade adquirida em aplicar os três princípios, Observação, Inibição e Direção, nesta relação dinâmica da cabeça com a espinha dorsal.
Vimos que a posição da cabeça influencia fortemente nossa coordenação, equilíbrio e orientação espacial. O processo de desenvolvimento humano leva anos para atingir a maturidade. Após o nascimento, nossa coordenação começa com vários reflexos trabalhando simultaneamente no corpo. Os reflexos primitivos, reflexo tônico-cervical, por exemplo, está presente em recém-nascidos e fica mais forte por volta dos três meses de idade. O reflexo tônico do pescoço ocorre pela rotação da cabeça, fazendo com que os braços e a perna se estendam para o lado para o qual a cabeça virou. Esses primeiros reflexos ajudam a desenvolver nossos padrões neurológicos, dividindo o corpo na linha média, o que mais tarde ajudará no engatinhar.

Os proprioceptores, o sistema vestibular e o sistema visual trabalham simultaneamente em relação ao corpo no espaço e na gravidade. A posição da cabeça contribui dramaticamente para a maneira como nos movemos e nos coordenamos. É comum ouvir alunos relatarem a sensação de flutuação e leveza pelo corpo quando a cabeça se move livremente.
Portanto, quando se trata de nosso senso de equilíbrio precisamos ver como nos organizamos por completo. A Técnica Alexander nos ensina a liberar a tensão muscular excessiva permitindo que o corpo restaure seu equilíbrio natural. Quando aquietamos nosso sistema, permitimos que os reflexos neuromusculares sutis do controle primário iniciem os ajustes finos em todo o nosso corpo. (Dimon Article 4)
A eficiência do controle primário (como organizamos nossa cabeça) é fundamental quando buscamos aprimorar habilidades, melhorar a coordenação, postura e bem-estar. Se estiver interessado em liberar as tensões em seu pescoço e experienciar mudanças em toda a sua unidade psicomotora, você pode encontrar um professor Alexander qualificado em sua área ou sinta-se à vontade para me enviar um msg.
Caso tenha interesse em saber mais sobre a Técnica Alexander, estou a disposição. Atualmente ensino a Técnica Alexander online e presencial na região de Alphaville, SP ou a domicílio.
Referências:
Sistema Vestibular
Proprioceptores
Proprioceptors nos ligamentos:
Técnica Alexander
Primary control
Reflexos primitivos
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