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  • Pedro Henrique

O aspecto linguístico e corporificado das palavras

Atualizado: 22 de jan. de 2022


Photo: Alfred Hitchcock by Gjon Mili, 1942

Dart: The Attainment of Poise

O aspecto linguístico e corporificado das palavras postura e poise*

Escrito por Pedro Souza


O método desenvolvido por Alexander nos auxilia em identificar e reeducar nossos padrões habituais de pensamento e movimento. O que pode ajudar na forma como interagimos conosco e com os outros.


O artigo de Raymond Dart 'The Attainment of Poise’ foi publicado pelo South African Medical Journal em 1947. Neste artigo, Dart explica um pouco sobre o processo na evolução do movimento. A diferença entre postura e poise e como o uso adequado do corpo pode promover saúde e bem-estar. O autor também menciona o trabalho de Este F. M Alexander, pois, pretendia apresentá-lo à comunidade médica. Dart foi introduzido à Técnica Alexander por Irene Tasker em 1943 e o estudou profundamente.


O artigo citado é uma rica fonte de informações aos interessados ​​no estudado da anatomia e no movimento corporal. No entanto, o que chamou a minha atenção foi o conceito semântico e corporificado das palavras: “postura” e “poise”. Muitos de nós não temos consciência de nossos padrões de comportamentos, pensamentos e sentimentos. E esses padrões podem influenciar o que definimos como nossa identidade. (Verplanken B; Sui J. 2019). Os padrões que carregamos ao longo de nossas vidas vêm de diferentes instâncias e a linguagem oral é uma delas. A linguagem permeia a vida social e está envolvida na maioria dos fenômenos que estão no cerne da psicologia social (R.M, C.-Y. 1998).


Muitos de nós não temos consciência de nossos padrões de comportamentos, pensamentos e sentimentos. E esses padrões podem influenciar o que definimos como nossa identidade. (Verplanken B; Sui J. 2019).

Algumas teorias sugerem que a linguagem e seus símbolos tornam-se significativos apenas quando são mapeados por experiências não linguísticas, como ações e percepções (Glenberg; Havas; Becker; Rinck, 1993). Os estudos da cognição incorporada afirmam que a percepção, as imagens e as ações são fundamentais na aquisição de conhecimento. Portanto, para dar sentido a uma linguagem oral, precisamos, em um certo grau, associá-la a alguma experiência corporal. Considerando crianças cegas, elas tendem a ter dificuldade em aprender um vocabulário que forneça informações sobre o mundo externo (Anderson; Dunlea & Kekelis. 2008), fazendo com que dependam de outros sentidos para criar associações significativas com as palavras.


A maneira como interpretamos a fala também influencia a maneira como percebemos nosso corpo. Enquanto estamos organizando nosso corpo no espaço e na gravidade (e tomando como exemplo a palavra postura), carregamos a ideia comum de que postura é algo relacionado a uma posição ereta fixa onde nossos ombros deveriam estar para trás e para baixo e o peito erguido.


Por outro lado, a palavra poise tem uma conotação diferente de postura, mas também pode estimular o “mau uso**” do corpo. No entanto, a palavra poise soa mais suave do que postura, o que pode induzir o corpo a suavizar. Olhando para o dicionário, descobrimos que a palavra postura tem suas raízes no verbo latino ponere, que significa: "pôr, colocar”. Em sinônimo do dicionário, postura está associada com atitude. Oposto à palavra postura, poise tem suas raízes no verbo latino pendere, que significa: “pendurar, fazer pendurar; peso, o que leva ao equilíbrio”. Podemos ainda entender poise como a parada momentânea em que as forças musculares em questão estão em um estado de equilíbrio. Ou qualquer posição que indique movimento suspenso (DART, 1947).


As palavras postura e poise são apenas exemplos que nos convidam a explorar ainda mais a ligação entre a linguística e a cognição corporificada. O funcionamento motor é crucial para auxiliar os domínios perceptivo, cognitivo e social (Adolph. 2018). Nossa função cognitiva é afetada pela forma como nosso corpo está organizado, podendo assim refletir em nossas atitudes auto relacionadas, como a confiança (Briñol, 2009).


Uma linguagem é um evento que cria estímulos acústicos (fala) e ópticos (escrever e gestos), o que torna a informação linguística intimamente relacionada à nossa percepção direta.

Portanto, os métodos que nos permitem ficar expostos a uma nova forma de pensar, agir e sentir o corpo têm grande impacto em como experienciamos a nós mesmos e o mundo ao nosso redor. F. M. Alexander mencionou em seu livro, ‘Constructive Conscious Control’, que:


“..nossos processos mentais são o resultado de experiências sensoriais em ação e reação psicofísica, e para empregar as diferentes partes do mecanismo nos atos da vida cotidiana, somos influenciados principalmente por processos sensoriais (sentimento). Assim, podemos receber um estímulo por meio de algo que ouvimos, algo que tocamos ou por meio de alguma outra agência externa. Em todos os casos, a natureza de nossa resposta, seja um movimento real, uma emoção ou uma opinião, dependerá da atividade associada em ação e reação, dos processos relacionados com a concepção e com os mecanismos sensoriais e outros responsáveis para o "sentimento" que experienciamos***”.


Alexander destacou que os processos mentais são o resultado de experiências sensoriais de ação e reação psicofísica. Uma linguagem é um evento que cria estímulos acústicos (fala) e ópticos (escrever e gestos), o que torna a informação linguística intimamente relacionada à nossa percepção direta. Mesmo que não saibamos do que se trata os dados linguísticos, nosso organismo ainda responde aos processos perceptuais (Wilson; Golonka. 2013).


No entanto, dependendo de como nossos padrões neuromusculares estão funcionando em relação ao nosso pensamento, podemos estar em um estado que Alexander chamou de apreciação sensorial não confiável. Isto acontece quando nossa consciência cinestésica não está em sincronia com nosso pensamento e vice-versa. Ao associar nosso pensamento a uma ideia de como nosso corpo está organizado no espaço e na gravidade e confiar solenemente em nosso feedback sensorial, podemos interpretar erroneamente o que estamos fazendo. Nosso pensamento está tão enraizado em como perceber nossos corpos que não pensamos conscientemente sobre como usá-lo.


Portanto, quando se trata de como interpretamos o mundo ao nosso redor, precisamos considerar o quão confiável é nossa percepção sensorial e consciência corporal. Estamos constantemente recebendo informações por meio de nossos sentidos e as processando subconscientemente. Uma das maneiras para restaurar nossa percepção sensorial e torná-la confiável novamente é prestando atenção em como respondemos (reagimos) às informações (estímulos). Nos reeducando, assim, de forma que as nossas respostas habituais não interfiram em nossa função geral. F. M. Alexander desenvolveu um método que ‘acessa' nosso subconsciente e que nos permite tonar conscientes de nossos padrões de pensamento, ação e percepção.

As palavras podem influenciar nossa percepção, e nossa compreensão incorporada (corporal) das palavras pode alterar seu significado real. Quando Dart menciona a diferença entre postura e poise, ele aponta para nossa compreensão errada dessas palavras e como isso tem sido responsável por uma grande confusão tanto na nomenclatura quanto no pensamento médico sobre o movimento (DART, 1947).


Olhando através da Técnica Alexander, descobrimos que as palavras e seu entendimento corporificado estão tão interconectados que um professor desse método frequentemente usará palavras que convidam expansão e liberdade. Nossos corpos desempenham um papel significativo no processo de dar sentido à linguagem, ao mundo a nossa volta e a nós mesmos. Ao compreender e usar nossos corpos de forma eficiente, abriremos novas possibilidades de pensar, agir e sentir. Podendo nos levar a uma compreensão clara de nossa realidade.

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* Eu escrevi este artigo, primeiramente na lingua Inglesa, embora português seja a minha lingua materna. E mesmo assim tive um pequeno conflito na tradução da palavra Poise. O dicionário me deu algumas traduções, porém elas não se encaixaram com o real significado da palavra em inglês. Por isto decidi deixar a palavra Poise em sua forma original, e de acordo com o Oxford Dictionary a palavra Poise significa: a capacidade de se mover ou ficar de pé de maneira atraente com bom controle do corpo.


** Walter Carrington apontou que poise pode sugerir escolas de charme e festas de chá e chapéus floridos e coisas desse tipo (Carrington, 1983).


*** Trecho retirado do livro de F. M. Alexander: Constructive Conscious Control, 8th Ed, 1955; pg 20. ‘Tradução livre feita por mim’

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Referencias:

Verplanken B and Sui J (2019). Habit and Identity: Behavioral, Cognitive, Affective, and Motivational Facets of an Integrated Self. Front. Psychol.

Krauss, R. M., & Chiu, C.-Y. (1998). Language and social behaviour; Columbia University and The University of Hong-Kong, 1998. web: http://www.columbia.edu/~rmk7/PDF/HSP.pdf

Arthur M. Glenberg, David Havas, Raymond Becker, and Mike Rinck. Grounding Language in Bodily States; The case for emotion, pg115. Book: Grounding cognition, The role of perception and action in memory, language and thinking. Cambridge University Press, 2005.

(Anderson; Dunlea & Kekelis. 1993): Blind children: https://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/014272379301303703

Walter Carrington’s commentary (March–May 1983) on ‘The Attainment of Poise’ by Raymond A. Dart

Raymond A. Dart; The Attainment of Poise, 1947. South African Medical Journal. Department of anatomy, University of the Witwatersrand, Johannesburg.

Karen E. Adolph. New York University. The development of motor behaviour, 2018. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5182199/

Pablo Briñol. Universidad autónoma de Madrid. Body posture effects on self-evaluation: A self-validation approach, 2009. https://onlinelibrary.wiley.com/doi/abs/10.1002/ejsp.607

F. M Alexander. Constructive Conscious Control; 1st published 1923; reprinted by Integral Press, 1955.

Borghi, Anna; Cimatti, Felice. (2009). Embodied cognition and beyond: Acting and sensing the body. https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0028393209004369

Andrew D. Wilson & Sabrina Golonka. Embodied cognition is not what you think it is, 2013. School of Social, Psychological and Communication Sciences, Leeds Metropolitan University, Leeds, UK. Web: https://www.frontiersin.org/articles/10.3389/fpsyg.2013.00058/full

David Evans. Language and Identity; Discourse in the world; Publisher: Bloomsbury Academic, 2015.

Embodied cognition; behind acting and sensing: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/19913041/

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